domingo, 8 de abril de 2012


Às margens do Capibaribe eu sentei-me e chorei


Nasci no século passado, melhor, no milênio passado. Mais exatamente em 1968. Janeiro (dia 23) daquele ano. Muito provavelmente tomei meu primeiro banho com  água tirada de uma cacimba cavada nas areias brancas do leito seco desse importante rio de Pernambuco.
Ainda guardo na memória o gosto da água. O gosto de areia. O gosto meio salobro. Água limpa e pura. Minha casa ficava às margens do rio. Não distava 100 metros do seu leito. Ficava no topo de uma ladeira. Mesmo perto do rio, a posição colocava nossa casa em segurança contra as enchentes, naquela época, bem freqüentes.
Acima da nossa casa, aproximadamente uns 500 metros rio acima encontra-se a cachoeira do Encantilado. Até meus vinte anos eu dormia embalado pelo barulho de suas águas batendo nas pedras. Durante os dias, eu me deliciava com os banhos nas suas águas. Nas águas barrentas e caudalosas no período de chuva, nas águas claras dos poços na cachoeira do Encantilado ou nas águas tiradas das cacimbas. Costumava também pescar. Aprendi a gostar de pescar nas águas do velho Capibaribe. Ele nunca me negava algumas piabas. E como elas eram bem-vindas naquela época.
Quando precisei sair das margens do rio da minha vida, foi com bastante saudade que o fiz. Deixei lá minha família e nunca mais voltei para lá morar. Mas depois de peregrinar por algum tempo em terras paulistanas retornei para Pernambuco e vim morar em Caruaru, onde resido desde 1992. Casei-me e gerei um filho, meu pequeno Rafael, hoje com dois aninhos.
Com certa freqüência, - bem menos do que gostaria - volto lá nas minhas antigas moradas e visito o velho Capibaribe. Quantas mudanças ocorreram desde 1988 quando sair de lá! Uma das principais foi a construção da barragem de Jucazinho. Por pouco as águas de sua represa não cobrem e a cachoeira do Encantilado, visto que ela termina exatamente ao pé delas.  E como Caruaru é abastecido também pelas águas do Capibaribe, eu, que atualmente moro em Caruaru, continuo ligado ao velho rio da minha vida.
Mas a mais terrível mudança pela qual vem passando o rio Capibaribe é a que presenciei neste último mês de março, quando visitei o meu velho rio pela última vez. Era tempo ainda de seca, O inverno ainda não chegou e como já se passaram mais de seis meses sem chuva na nossa região era para que o rio estivesse seco. Era para que as cacimbas estivessem aparentes nas suas areias brancas. Mas o que eu presenciei me deixou chocado. Pelo leito do rio ainda corria um filete de água até que significativo. Fiquei chocado não somente por isso. Pelo fato de o rio ter se tornado perene.  Mas por ver que aquela água cor de chá que corria ali nada mais era do que água de esgoto.  Água de esgoto proveniente quase na sua totalidade das lavanderias instaladas nas localidades rio acima, principalmente nas cidades de Toritama e Santa Cruz do Capibaribe.
Aquelas águas cor de chá não são águas limpas como eu estava acostumado a ver nos fins de período de verão… Naquelas águas limpas eu costumava tomar banho. Nestas, cor de chá eu nem tive coragem de lavar os pés.  Sentei-me nas pedras da cachoeira do Encantilado e chorei. Chorei por ver seus poços cheios, convidativos para um banho e totalmente impróprios para tal. Chorei por ver suas águas antes limpas, agora escuras e venenosas. Chorei por quase não ver peixes onde antes havia muitos.
É preciso que sejam tomadas providências urgentes para que isso seja corrigido. Não podemos nos esquecer que além de devolver o rio ao seu estado original de limpeza e pureza de suas águas por uma questão de justiça ambiental, devemos fazê-lo para que possamos ter águas limpas, afinal, aqui em Caruaru, estamos bebendo daquelas águas e é na barragem de Jucazinho que está desaguando toda aquela água poluída que vi.
Não ignoro a importância econômica que o pólo têxtil da região trás para o nosso povo tão sofrido por causa da constante instabilidade de nosso clima.
A solução para a fixação do nosso povo na nossa terra tem sido esse tipo de atividade e todas as outras atividades indiretas ligadas a ela.
Mas nada disso justifica o que vi. É preciso que todos se conscientizem de que é preciso que o progresso chegue mas também que se preserve a natureza e que tenhamos água limpa porque precisamos dela para viver.

Autor: Djalma Alves   Caruaru, 08 de abril de 2012   

Nenhum comentário:

Postar um comentário